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O que é necessário para ser ídolo no Corinthians?

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    Na Marcação
  • 29 de nov. de 2018
  • 10 min de leitura

Atualizado: 9 de dez. de 2018

Por Enrico Ziotti

29/11/2018 | 23h28


Para o Dicionário, ídolo é uma “Celebridade por quem se tem grande admiração ou a quem se ama apaixonadamente”.

No futebol, ídolos são geralmente lembrados por títulos importantes, gols cruciais, defesas incríveis.

Para Márcia Mariano, doutora em Filosofia e Língua Portuguesa pela Universidade de São Paulo, que analisou certos discursos de Ronaldo Fenômeno no artigo “Ronaldo: Fenômeno, ídolo ou herói? Análise das estratégias argumentativas utilizadas pelo jogador em sua despedida do futebol” de 2011, a imagem de idolatria no futebol não se deve somente a atuações dentro de campo. Para ela, demonstração de afeto com a torcida, gratidão pelo time, humildade, assumir erros e mostrar superações são grandes responsáveis para a eternização de um jogador na história de um clube e no coração da torcida.

Com a saída de Danilo e a aposentadoria de Sheik, muito se discute para os definir como ídolos do clube e há unanimidade entre torcedores e especialistas que os dois se encaixam nessa classificação. Por outro lado, ainda existem muitos debates sobre jogadores do Corinthians, aposentados ou atuantes, para classificá-los como ídolos do Timão.

Para se eternizar no Time do Povo, jogos decisivos e atuações marcantes são o pontapé inicial para torcedores enxergarem jogadores de forma única.


EXEMPLOS

Ao entrevistar Lorran Battista, estudante de Direito na Universidade de São Paulo, o corintiano de 20 anos indica jogadores de gerações passadas:

“O Neto, pois defende o Corinthians dentro e fora de campo, Tévez tinha raça, se identificava com a torcida. Todo mundo tinha uma camisa escrito ‘Carlitos’ nas costas.“

E também reconhece jogadores atuais nesse patamar: “Em 2012, Danilo, Cássio e Sheik para mim, viraram ídolos pela campanha deles, pela raça, pela estrela que eles têm. O Romarinho também virou ídolo, porque, na primeira final de Libertadores, que seu time estava perdendo, o moleque de 19 anos – até arrepio – chega e dá uma cavadinha no goleiro. Até o Guerrero é ídolo, mesmo do jeito que saiu. Outros já saíram e saem desse jeito. Se não fosse ele, na hora do cabeceio nos jogos contra o Al Ahly e do Chelsea, não teríamos mundial.”

Ao ser perguntado sobre Ronaldo, campeão do mundo em 2002 com dois gols na final e três vezes eleito melhor jogador do mundo, há grande reconhecimento da importância dele para o Corinthians não só dentro de campo:

“Ele mudou a cara do Corinthians, tirou do buraco. Trouxe patrocínio, nome, além do Paulista e da Copa do Brasil”

Para descrever melhor a importância de Ronaldo Fenômeno para o Corinthians, André Ranieri, setorista do Timão pela Jovem Pan, enfatiza a volta por cima de Ronaldo:

“Apesar de muita gente acreditar que não conseguiria jogar em alto nível, ele jogou muito bem. Em 2009, por exemplo, foi o auge da forma física dele nesse retorno ao Corinthians, tem aquela arrancada que ele dá no Campeonato Paulista contra o São Paulo e na Copa do Brasil ele foi importantíssimo, então ele marcou muitos gols e a qualidade era a mesma, ele conseguiu mostrar isso no Corinthians apesar das dúvidas.”

Além disso, não deixa de fora a grandeza do jogador:

“O Ronaldo representava muito dentro de campo. Por exemplo: O Corinthians toma um gol, você é o Dentinho [por exemplo], no momento difícil, talvez você se desestabilize, mas quando você tomava o gol e via o Ronaldo, que já ganhou uma copa do mundo, melhor jogador do mundo, com aquela calma, serenidade, você fica tranquilo. Ele potencializava o desempenho dos demais jogadores do Corinthians. Não diria que ele tinha liderança, mas só a presença dele era significativa. Ele trouxe confiança ao torcedor.”


QUEM SÃO

Para o torcedor Lorran, um ídolo marca o momento. “Os ídolos para mim foram os que marcaram de alguma forma. No Corinthians, o ídolo é quem dá raça, que dedicação nunca vai faltar.”

Ao falar com Celso Unzelte, jornalista da ESPN e historiador do Corinthians, sobre o que todos os jogadores devem ter para se tornarem ídolos no Timão, a resposta abrange várias características:

“Uma vez, no centenário no Corinthians, eu falei que um ídolo não é necessariamente um craque. O ídolo é, antes de tudo, quem sente a camisa. Então, você tem casos de casos de craques que sentiram a camisa, como o Luisinho, Velho Neco, o primeiro de todos os ídolos.

O outro conceito, que já não é tão atual, porque os jogadores vão embora logo, é o conceito de ‘tempo de casa’. Então, jogadores como Vladimir, Zé Maria, o próprio Rivellino, que é, na minha opinião, o jogador mais capaz que já vestiu a camisa do Corinthians.

Além disso, Unzelte também enfatiza ídolos que não foram reconhecidos pela técnica.

“Por outro lado, você tem gente como o Biro-Biro, que não é propriamente um craque e não fosse ídolo em nenhum outro clube. Às vezes falam que precisa ser campeão para ser ídolo. O Rivellino tem muito menos título que o Biro-Biro e tem uma distância daqui até a lua entre a categoria dos dois.”.


A HISTÓRIA

Para achar alguma semelhança entre jogadores que se eternizaram por motivos distintos, é necessário fazer um levantamento breve da carreira dos citados a fim de identificar similaridades:


Rivellino

(Fonte: Blog do Juca Kfouri)

É provavelmente um dos maiores jogadores de futebol da história e possivelmente um dos jogadores mais injustiçados que vestiram a camisa do Corinthians, por só ter conquistado a Copa Rio-São Paulo de 1966. Foi criador do “elástico”, drible usado até hoje por grandes jogadores do futebol mundial. Durante uma entrevista, admitiu que trocaria a Copa do Mundo de 70 pelo título Paulista de 76, pelo Corinthians.


Zé Maria

(Foto: Meu Timão)

Ficou marcado pela garra e pelo seu amor ao Corinthians. Ganhador de quatro Paulistas (77, 79, 82 e 83), declarou que, pelo Corinthians, jogaria até de graça. Antes de entrar para o Timão, prometeu ao pai que seria campeão pelo time alvinegro e assim o fez. Em sua memorável despedida, declarou à torcida que “Estão tirando um pedaço de mim” e sua camisa pode ser encontrada no memorial do Corinthians com a frase “A esse clube, que durante muitos anos foi a minha própria vida”.


Wladimir

(Foto: Arquivo Folhapress)

Também tetracampeão Paulista pelo Timão, Wladimir foi o jogador que mais vestiu a camisa do Corinthians na história. Foram 805 jogos que ficaram marcados pelo seu amor ao time e pela grande presença na criação da Democracia Corintiana. Quando aposentou, declarou que “todo garoto deveria ter a oportunidade que eu tive. Foi mágico”.


Sócrates

(Foto: José Pinto/VEJA)

Principal criador da Democracia Corintiana, Sócrates ficou conhecido não só pelas atitudes extracampo que iam contra o regime militar da época, mas também por seus passes de calcanhar (por isso o apelido “calcanhar de ouro”) e pela campanha do bicampeonato Paulista de 82/83. Reza a lenda que Sócrates uma vez disse “Quero morrer num domingo de Corinthians campeão.”. Ele faleceu dia 4 de dezembro de 2011, num domingo que o Timão conquistou o pentacampeonato Brasileiro. Unzelte ainda completa o perfil de Sócrates com o depoimento: “Ele era o cara certo no momento certo. O Corinthians tinha saído daquele sofrimento e ele 'reaculturou' a torcida nesse sentido, era um craque cerebral, muito solidário. Não queria ser a estrela, exercia uma liderança muito solidária, fazia todo mundo se sentir participativo naquele processo da Democracia Corintiana. Ele foi um ídolo muito original e muito inteligente ao saber trabalhar com esses elementos da paixão corintiana.”


Biro-Biro

(Foto: Acervo/Gazeta Press)

Chegou ao clube e foi anunciado pelo presidente como “um tal de Lero-Lero”. Não se eternizou pela técnica, mas pelo seu carisma, a participação direta da Democracia Corintiana, ter sido campeão de quatro Campeonatos Paulistas e por sua garra em campo, sua entrega nunca foi questionada.


Neto

(Fonte: Meu Timão)

Foi um dos maiores jogadores que já vestiu a camisa do Corinthians e um dos maiores batedores de falta que o mundo já conheceu. Neto ficou conhecido pelas cobranças de falta, por sua técnica e principalmente pelo amor pela camisa branca e preta. Foi principal responsável pelo primeiro título de um Campeonato Brasileiro do Corinthians, em 1990.


Tévez

(Foto: Gazeta)

O maior estrangeiro que já jogou no Corinthians. Carlitos foi rapidamente adotado pela torcida por sempre se esforçar em campo e fazer muitos gols, foram 46 em 78 jogos. Por conta de suas atuações de gala, o time alvinegro conquistou o Campeonato Brasileiro de 2005, fatídico ano em que o Timão aplicou a goleada de 7x1 sobre o rival Santos, com direito a três gols do Argentino.


Ronaldo

(Foto: Tudo Timão)

Três vezes melhor jogador do mundo, autor de dois gols na final da Copa do Mundo de 2002, o Fenômeno foi um dos maiores jogadores da história do futebol. Chegou ao Corinthians depois de mais de um ano parado, acima do peso e desacreditado por muitos, sendo taxado como “ex jogador em campo”. Ronaldo ganhou o Campeonato Paulista e a Copa do Brasil de 2009, com direito a gols nas duas finais. Além da atuação em campo, o jogador também trouxe muita visibilidade para o time e, consequentemente, muitos patrocínios que revolucionaram a estrutura do clube para sempre.


Danilo

(Foto: Folhapress)

Chegou em 2010 desacreditado pela torcida, por não ser um meia de velocidade. Porém, rapidamente conquistou grande espaço no coração do torcedor e foi um dos jogadores mais vitoriosos do Timão. Conquistou três Campeonatos Brasileiros, dois Campeonatos Paulistas, uma Copa Sul-Americana, uma Libertadores e um Mundial de Clubes. Fez gols importantíssimos em todas as campanhas, principalmente na Libertadores. No Mundial, foi grande responsável pelo gol de Guerrero, contra o Chelsea.


Sheik

(Foto: Michael Regan/FIFA)

Emerson chegou ao Corinthians em 2011, faturou o Brasileirão do mesmo ano e foi peça fundamental para a conquista invicta da Libertadores. Além das exibições de raça, marcou um golaço contra o Santos na semifinal e foi autor dos dois gols da vitória do Corinthians sobre o Boca Juniors no segundo jogo da final. Após a conquista do mundial, declarou “depois de fazer o gol contra o Chelsea, era difícil qualquer time no mundo fazer gol em nós.”.


O QUE PRECISAM TER


Muitos títulos, gols, raça. Para Unzelte, existe alguns componentes necessários para tornar-se um ídolo no Timão.

“As vezes falam que precisa ser campeão para ser ídolo. O Rivellino tem muito menos título que o Biro-Biro e tem uma distância daqui até a lua entre a categoria dos dois. O caso do Romero, é um jogador que se identificou muito pela entrega, não é propriamente um craque.

Então, isoladamente, tempo de casa, capacidade técnica, identificação, títulos... Talvez não seja necessário ter tudo isso, mas é necessário ter pelo menos uma dessas características”

Quando perguntado sobre os novos ídolos que surgiram, o jornalista categorizou certos exemplos de novos ídolos, mas com padrões da geração antiga:

“Os ídolos dos novos tempos são muito mais eficazes do que eficientes. Não existe mais o cara que você, quando criança, via jogando no seu time e você virava adolescente, casava e ele continuava lá. Rivellino, Biro-Biro, a não ser que seja um caso muito específico, como a posição de goleiro, como o Ronaldo no Corinthians, Marcos no Palmeiras, Rogério Ceni no São Paulo, eles são menos assediados pelo mercado exterior. De lá para cá, você teve ídolos mais eficazes que eficientes. O Tévez, Ronaldo fenômeno, Paulinho. Para ser ídolo, tem que atender pelo menos uma dessas cobranças.”.


NOVA GERAÇÃO

Ronaldo, Rivellino, Sócrates. Ídolos incontestáveis do Timão. Além desses e dos já apresentados, existem jogadores que geram certa divergência entre a própria torcida sobre o título de “ídolo” e o mais recente nessa situação é Romero. Campeão de dois campeonatos Paulistas, dois Brasileiros e atual artilheiro da Arena Corinthians com 27 gols, o paraguaio é alvo de muito julgamento de jornalistas e torcedores.

Para Lorran, Romero está no caminho para se consagrar na história corintiana.

“Ele está caminhando para ser um ídolo, mas ele é ‘de lua’. Tem jogo que ele está muito bem e tem jogo que está muito ruim, mas acredito que ele não seja um ídolo do mesmo estilo que os outros, ele é um xodó da torcida. Ele é esforçado, mas não vai ser ídolo igual um Danilo”

Provavelmente a maior crítica seja a inegável inconstância do paraguaio. Apesar de ser conhecido pela entrega intensa dentro de campo, no início do ano, o paraguaio atingiu a marca histórica de 6 gols em apenas 3 jogos, a melhor de sua carreira. Por outro lado, após esses jogos de invejar qualquer centroavante, ele enfrenta o pior momento de sua trajetória como jogador, são mais de 120 dias sem marcar um mísero gol.

“O Romero está virando ídolo. É aquela relação de amor e ódio. Você xinga, xinga e xinga ele, mas se alguém fala mal, você xinga a pessoa também, só eu posso.”

Após um empate do Corinthians contra o Atlético-MG por 1x1 pelo Brasileirão, Celso Unzelte fez uma crítica à uma das substituições do time e comentou “Tanta gente para tirar e vai tirar o Romero?”

Ao perguntar sobre esse caso para o jornalista, ele completou: “O caso do Romero: é um jogador que se identificou muito pela entrega, não é propriamente um craque.”


QUEBRA DO MITO

Ao falar de Romero, se abre uma discussão antiga no futebol. Muito se ouve de “Esse jogador é ídolo nesse time mas em outro não seria” na boca dos torcedores. Seria isso mito ou verdade?

Lorran, o torcedor entrevistado, quando apresentado à essa discussão, foi categórico: “Nenhum ídolo do Corinthians teria sido tão ídolo em outro time. Porque tem um Q maior, o apego do jogador a essa característica [raça] e identidade com a torcida. No Corinthians, isso é muito maior. [...] É diferente, especial. A relação com a torcida é diferente, então não dá.”

Para Unzelte, um craque pode ser ídolo em qualquer time, mas o peso da camisa é determinante para o eternização do jogador no clube. “O Corinthians tem uma cultura de raça, vontade, entrega. Tem gente que se identifica tanto com isso que não conseguiria ser ídolo em outros lugares. Já o craque consegue ser ídolo em vários lugares. Onde ele vai, ele ganha títulos, vai jogar bem."

Além disso, o historiador corintiano também completa dizendo que há, também, diferentes exigências em outros clubes. “Algumas torcidas cobram mais esse futebol mais refinado como Cruzeiro, Santos, São Paulo, essa coisa do ‘DNA ofensivo’. Corintiano não está nem aí, corintiano quer que o Corinthians ganhe, nem que seja dando bico para lateral, é muito pela cultura das torcidas. No caso do Corinthians, para ser ídolo, não precisa ser necessariamente craque, mas precisa entender onde se está pisando. Gente como o Romero entende isso muito bem.”.

Se Romero, tão criticado pela falta de técnica mas exaltado pela força de vontade, entra na categoria de ídolos do Corinthians, a raça seria um fator crucial para o jogador entrar no coração da torcida? Para Unzelte, isso acontece e não só no Timão.

“Em muitos clubes, sim. O Corinthians é um deles. A história do Zé Maria, não era um primor de técnica, apesar das participações em duas copas do mundo, o próprio Vladimir, esses ‘deuses da raça corintiana'. O Corinthians consegue transformar jogadores em ídolos num gol só. Viola, Romarinho, o próprio Sheik está mais ou menos nessa categoria. Embora não ser um jogador ruim tecnicamente, o que vai imortalizar o Sheik na história do Corinthians é que ele ganhou aquela Libertadores.”

Portanto, apesar de gols, defesas, títulos e comportamentos de afeto com a torcida, gratidão pelo time, humildade, assumir erros, a raça é um fator determinante para ser ídolo no Corinthians. Isso pode ser demonstrado citando jogos importantes da história do time, todos têm a raça como semelhança, mesmo que o jogo não seja uma final de campeonato.

“O Corinthians tem grandes jogos que não valiam título em sua história. A quebra do tabu do Santos de 68, a invasão no Maracanã em 76, o dia que o Adriano fez gol contra o Atlético MG em 2011, o jogo com o Vasco no meio da Libertadores, aquele gol que o Ronaldo faz de cabeça na volta contra o Palmeiras, seguramente, é o gol do Corinthians mais visto no mundo. O mundo inteiro viu. Ninguém nem lembra que o Corinthians nem ganhou aquele jogo, só empatou. É um jogo que o Palmeiras perdeu de 1x1. Só o Corinthians tem isso. Para o Corintiano, basta o Corinthians. Não tem aquela coisa de tamanho do campeonato, ela aquela coisa de ‘sentir’, é diferente.” conta Unzelte, que vê esses fatores de “sentir a camisa” como o mais relevante para o Corinthians.

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